quinta-feira, 31 de março de 2011

Vida Torta


Caminho torto
por passeios feios
de calçadas tortas
eu, que sou tão certo!
Vou passando, indo...
- Que importa aberta a porta
quando há gente fechada lá dentro
- Que importa noutra entrar
também há gente lá
pessoas que se abrem
- sinistramente -
naturalmente em portas fechadas.
Apresso o passo
vou passando
pernas comendo ruas
e paralelepípedos pontudos
lambendo os passos...
 Vou que vou
dando as minhas topadas 
aqui e ali
trombando com gente 
de olhar maior do que a barriga
da esquina
que
- saliente e gélida -
parece insinuar a existência
de um pífio rei dentro dela.
Contudo, vou
empertigado, sem destino
os pés feridos
no sapato preferido...
 - Quem sabe não estarei por demais abstêmio
- completamente desatinado -
ou talvez mesmo perdido!
Assim mesmo eu vou
e voo...
Mas como voa o tempo!
E agora 
aqui me encontro de novo
aqui estou
E já passados
acertados todos os passeios
as calçadas continuam tortas 
e eu feio...
Pois tão certo já não sou
já que a vida
Essa vida me entortou.

Meninos de Rua


A vida assina
O que a rua ensina
    E insinua
                     Que nas noites nuas
A lua não é só dos namorados
Mas de criaturas alheias
Nuas
Despidas de lares
De olhares vivos nos semblantes crus

E aqueles que se cruzam
Bem sabem a quem cabem
As agruras dos dias
A largueza das ruas
 Frias
                                Também nuas...

E o poeta pinta no olho da rua
Traga com a boca da noite
A sua cor
                   A sua dor
                                        E canta

    Lança no olho da noite
Cânticos repletos de luz
    E espanta 
                        Quem não sabe olhar...

... E a vida ensina:
- Como é perverso
O olho
da
rua!


domingo, 27 de março de 2011

A Festa das Letras



                                   
Afortunadamente nesta hora
Em que escrevo este poema
A Pena espirra vida pelo bico
E começa a criar estórias...

... Eis que surge então
A festa das letras...

 Como que a andar de carrossel
Ela convida lindas e dançarinas palavras
A bailarem livres
Sobre o assoalho branco do papel

E quando a festa se anima
Os pingos dos Is
Rejeitam o trema do U
E no espaço aberto do salão
O til baila tranquilo sobre alguns As
Com toda aquela sua mansidão

Alguns Es circunflexos
Deseducados e mal procedidos
Não suportam certos Os
A tomarem os seus chapeuzinhos
Enxeridos e desenxabidos

Certo A com aquele seu grave acento
Desaponta  um humilde acento agudo do O
um O que às vezes se isola entre parênteses
Mas que se sobressai com amigos em aspas

Determinado ponto
Sente um ciúme danado da vírgula
Ao vê-la com outros em traço de união
E vive um verdadeiro suplício
Sugerindo à Pena que o una definivamente
À tal da vírgula

O ponto de interrogação por excelência
Indaga ao ponto de exclamação
- Qual o motivo da ausência
De tão formidável criatura
A bela e admirável reticência?...

E quando adentra tão graciosa figura
No glamour da festa
Um Ç maluco sai correndo direto do toalete
E logo começa a entrar na dança, muito louco
Com aquela cedilha em si pendurada
Causando risos e inconvenientes transtornos...

É quando então surge do lado
Empunhando uma seta
O famoso Ponto Final
E acaba com a festa...

...E a linda Pena nem se dera conta
De que no assoalho branco do papel
Ela fora a principal estrela
A maior dançarina da festa.